Viaduto das Artes

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Debaixo do viaduto, um ecossistema de criação, cuidado e futuro

Sob o Viaduto Engenheiro Andrade Pinto, na Avenida Olinto Meireles, 45, em Belo Horizonte, um espaço antes esquecido pela cidade se tornou um símbolo de transformação urbana e social. O Viaduto das Artes, localizado na região do Barreiro, ocupa cerca de mil metros quadrados e abriga galeria de arte, biblioteca, ateliês, sala de oficinas, quadra esportiva e área de convivência.

Mais do que um centro cultural, o Viaduto é um laboratório vivo de arte, educação e cidadania, que mostra como a cultura pode reescrever o destino de um território. Onde antes havia sujeira, medo e exclusão, hoje há vida, encontros, aprendizado e oportunidades.


A faísca: Leandro Gabriel e a aposta no impossível

A história do Viaduto das Artes nasce do olhar e da coragem do escultor Leandro Gabriel, artista e morador do Barreiro. Sua trajetória é um exemplo de como a persistência e a sensibilidade podem transformar uma cidade.

Nos anos 2000, Leandro realizou um projeto de revitalização no Parque das Águas, também no Barreiro. Apesar do sucesso da iniciativa, o poder público pediu que ele deixasse o local. Como alternativa, a Prefeitura de Belo Horizonte ofereceu outros espaços — entre eles, um viaduto abandonado, que muitos consideravam inapropriado para qualquer uso cultural.

Foi então que surgiu a frase que guiaria toda a empreitada:

“Se a gente conseguisse mudar a realidade debaixo de um viaduto, a gente poderia mudar qualquer realidade.” — Leandro Gabriel

O que parecia improvável ganhou corpo em 2006, quando o artista iniciou a limpeza e a reorganização do espaço, com a ajuda de voluntários e da comunidade. A área, antes marcada pela presença de uma cracolândia e por altos índices de violência, foi sendo gradualmente resgatada para o convívio social.

Essa experiência pioneira acabou influenciando políticas públicas. Até então, a ocupação de áreas sob viadutos era proibida em Belo Horizonte. A mobilização de artistas e moradores levou à Lei 10.443/2012, que passou a permitir o uso cultural, esportivo e de lazer desses espaços. Em 2016, o Decreto 16.234 formalizou a cessão do local à Associação Viaduto das Artes, consolidando o projeto como uma referência nacional em requalificação urbana via cultura.

Hoje, o Viaduto é um espaço reconhecido oficialmente como Ponto de Memória pelo MuseusBr, e sua história é estudada por pesquisadores da UFMG, artistas e gestores culturais de todo o país.


Originalidade que se sustenta em prática

O Viaduto das Artes tornou-se um ecossistema cultural multifacetado, que combina exposições de arte, oficinas educativas, residências artísticas, ações sociais e esportivas.

Exposições e programação artística

Desde 2014, o Programa de Exposições apresenta em média quatro mostras por ano, com destaque para nomes expressivos das artes visuais contemporâneas, além de artistas locais e estudantes. Entre as mostras realizadas estão:

  • Rodin – Paixão e Ternura (2014), com nove réplicas de esculturas do mestre francês, vindas do Museu Rodin de Paris;

  • Catadores (2014), de Daniel Moreira e Leandro Gabriel;

  • Sinfonia em Dor Maior (2017), também de Leandro Gabriel;

  • Festa, de Berna Reale (2019);

  • Lendo e Escrevendo com Anne Frank (2022);

  • Favela Hacklab e Mostra&Lab (2022), que unem arte, ciência e tecnologia em projetos educativos.

O espaço também já sediou coletivas como Outros Territórios, Sobre o Corpo e a Linha e A Dimensão Ideal do Espaço, além de mostras da Escola Guignard e do Festival de Fotografia de Belo Horizonte (FIF BH).

Educação e formação

Um dos diferenciais do Viaduto é o investimento em formação artística e profissional. As oficinas, cursos e vivências são voltadas tanto à comunidade local quanto a estudantes e educadores.

Entre as iniciativas recentes estão:

  • Viaduto Café – Formação em Barismo, que ensina fundamentos do café, técnicas de extração e hospitalidade, promovendo inclusão produtiva e oportunidades de trabalho;

  • Arte, Cultura e Costura, curso gratuito com 240 horas voltado a mulheres acima de 60 anos, combinando aprendizado técnico, empreendedorismo e fortalecimento da autoestima;

  • Favela Hacklab e Mostra&Lab, voltados à cultura maker e à experimentação artística em escolas públicas, com patrocínio da Vale S.A.;

  • Bolsa Pampulha, em parceria com a Prefeitura de Belo Horizonte, que incentiva artistas locais a desenvolverem obras no espaço do Viaduto;

  • Viaduto em Movimento, Viaduto em Cena e Cinema no Viaduto, que oferecem programação de música, teatro, audiovisual e poesia de forma gratuita.

Esporte e convivência

A quadra de beach tennis é uma das imagens mais emblemáticas do projeto. Localizada sob o viaduto, ela recebe cerca de 100 alunos por dia, em turmas que envolvem crianças, adolescentes e idosos. A atividade é resultado da parceria entre o ViaShopping Barreiro e a UEMG – Campus Ibirité, que inclui o projeto em seu programa de extensão.

Além de democratizar o acesso ao esporte, a quadra se tornou um ponto de encontro entre gerações, onde o lazer, o aprendizado e o cuidado físico se unem em um espaço seguro e acolhedor.


Vozes que ecoam: o poder feminino na arte

Em outubro de 2025, o Viaduto das Artes foi palco de um dos eventos culturais mais simbólicos do ano: o projeto Vozes Femininas – Do Silêncio ao Grito, idealizado pela cantora Dea Trancoso e coordenado por Josiane Amâncio.

O espetáculo reuniu Coral, Irene Bertachini, Isaddora, Iza Sabino e Júlia Tizumba, acompanhadas por uma banda composta exclusivamente por mulheres — Débora Costa (bateria), Raíssa Uchôa (baixo) e Glaw Nader (teclado) — e apresentação de Efe Godoy.

Mais do que um show, o projeto propôs vivências e rodas de conversa com mulheres vítimas de violência, em um processo de escuta e criação coletiva. A iniciativa percorreu diversas cidades de Minas Gerais — entre elas Sabará, Betim, Juiz de Fora, Contagem, Santa Luzia, Ouro Preto e Itabira — antes de encerrar no Barreiro, com ingressos gratuitos e plateia formada, em sua maioria, por mulheres.

“Corpos e vozes femininas atravessam a jornada do silêncio ao grito”, resumiu Dea Trancoso. O resultado é um canto coletivo que une cura, acolhimento e resistência.


Cultura, cidade e sustentabilidade

O Viaduto das Artes é uma expressão concreta dos princípios da Agenda 2030 da ONU, especialmente do ODS 11 – Cidades e Comunidades Sustentáveis, que propõe tornar as cidades mais inclusivas, seguras, resilientes e participativas.

A ocupação do viaduto demonstra que a arte pode ser um instrumento de urbanismo social, ressignificando espaços públicos e fortalecendo vínculos comunitários. Ao devolver a cidade às pessoas, o projeto promove cidadania ativa, bem-estar e pertencimento.

Também dialoga com o ODS 4 – Educação de Qualidade, ao oferecer aprendizagem contínua e oportunidades formativas, e com o ODS 5 – Igualdade de Gênero, ao ampliar o protagonismo feminino e criar redes de apoio por meio da arte.

Mais do que um espaço cultural, o Viaduto das Artes é uma política viva de cultura e convivência, que inspira gestores, artistas e cidadãos a olharem o território urbano como campo fértil para transformação.


Fontes consultadas

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